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Disciplina: As coisas que se escrevem (Coisas_escrevem)
Glossário: Nos Jornais, Revistas e Blogs…

Um ano de desafios

(Última edição: sexta-feira, 21 de outubro de 2005 às 15:56)
2005-09-18 - 00:00:00, Correio da Manhã

Opinião


Um ano de desafios

A Sociedade evolui e por isso a formação a ministrar não pode deixar de lado preocupações de cidadania, de conhecimento, de cultura, de desporto, enfim, da plenitude de uma intervenção cívica que bem alicerce a razão de ser do cidadão de pleno direito.
O início de cada ano lectivo é marcado pela expectativa que todos os que nele se vêm envolvidos colocam, quer sob o ponto de vista do ensino propriamente dito, quer sob o ponto de vista do conjunto das condições que asseguram a sua normalidade.

Este ano, àquelas expectativas acrescem as alterações consagradas na nova Lei de Bases, que acarretarão para o Ensino Superior o colocar de novas hipóteses de trabalho abrangendo a implementação de novas metodologias, novos curricula, novas atitudes face aos processos de ensino e de aprendizagem e, principalmente, as que decorrem do designado Processo de Bolonha.

Na realidade, o Processo de Bolonha traz consigo a exigência de uma maior participação dos professores na vida dos estudantes e, simultaneamente, exige dos estudantes uma nova atitude perante os professores e o ensino, pressupondo uma posição activa e permanente na assimilação dos conhecimentos, com consequente rejeição da passividade apenas alterada pela urgência requerida pela ameaça dos exames.

Daqui decorre também a importância de uma reflexão que tem de ser feita por todos, quer quanto à duração dos ciclos previstos no referido Processo de Bolonha, quer quanto à nova organização de mestrados e ainda ao combate ao insucesso escolar, à boa aceitação dos perfis académicos face às solicitações do mercado de trabalho e, naturalmente, à plena realização pessoal e profissional.

A este novo mundo de desafios deverá corresponder uma atitude positiva por parte da universidade, sabendo bem receber os que a procuram e a ela se acolhem, e que nela confiam, não esquecendo que o seu papel não pode resumir-se ao de mero transmissor de conhecimentos e esgotar a sua capacidade na apresentação de um saber adquirido e consolidado.

A sociedade evolui e por isso a formação a ministrar não pode deixar de lado preocupações de cidadania, de conhecimento, de cultura, de desporto, enfim, da plenitude de uma intervenção cívica que bem alicerce a razão de ser do cidadão de pleno direito.

Dir-se-á que é exigir muito e que, com tanta solicitação, o estudante tem pela frente uma tarefa intransponível.

Mas não pode ser essa a atitude. Há que confiar nas capacidades e nas vontades. E há, acima de tudo, que encontrar o método que permita conciliar os diferentes deveres para os canalizar para o resultado final pretendido: o sucesso. Os alunos não podem ser, hoje, meros espectadores: têm de ser interventivos, participantes e activos.

É com este espírito que temos de partir para o novo ano: a universidade é um local de trabalho em que todos têm de tomar parte, transmitindo saberes já adquiridos, construindo novos mundos de conhecimento, buscando o enriquecimento cultural e científico, com abertura de espírito às inovações dos processos, tendo por meta final o bem-estar da sociedade.

José Lopes da Silva, Presidente do Conselho dos Reitores das Universidades Portuguesas

Números e ideias feitas, João Ferreira do Amaral

(Última edição: sábado, 29 de outubro de 2005 às 16:34)
Expresso, 29 de Outubro de 2005

Em Portugal compensa ser licenciado

(Última edição: sábado, 29 de outubro de 2005 às 16:37)
Expresso, 29 de Outubro de 2005

Bill Gates diz que dentro de 5 anos 40 a 50% lerão a imprensa online

(Última edição: domingo, 30 de outubro de 2005 às 18:03)
Bill Gates diz que dentro de 5 anos 40 a 50% lerão a imprensa online

Arthur C Clarke e os satélites

(Última edição: segunda-feira, 31 de outubro de 2005 às 09:35)
Arthur C Clarke e os satélites

Inédito: GNR entrou no campus do Monte da Caparica

(Última edição: quarta-feira, 2 de novembro de 2005 às 22:35)
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2005-10-02 - 13:00:00

Inédito: GNR entrou no campus do Monte da Caparica


Festa do caloiro na Nova acaba com bastonadas

Jorge Godinho
A carga policial teve lugar dentro da Faculdade de Ciências e Tecnologia, onde decorria uma festa
A carga policial teve lugar dentro da Faculdade de Ciências e Tecnologia, onde decorria uma festa
Era a festa de encerramento da Semana do Caloiro na Faculdade de Ciências e Tecnologia, no Monte da Caparica. Havia música alta e cerveja a rodos. Pelas 5h00, dois grupos de rapazes envolveram-se em desacatos. Houve chapadas e pontapés. Pouco tempo depois, o Pelotão de Intervenção Rápida da GNR entrou no campus universitário. Ninguém escapou às bastonadas. Levaram os desordeiros e os outros. Pelo menos cinco estudantes, com hematomas e lesões, foram assistidos no Hospital Garcia de Orta, em Almada. Revoltados, os pais dos jovens feridos, decididos a apresentar queixa, lembram que, mesmo antes do 25 de Abril, não foi dada autorização à polícia para entrar nas universidades.

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O Gustavo, aluno do 4.º ano de Engenharia Civil, foi atingido por um bastão no joelho. Por sorte, disse, não lhe partiram qualquer osso, mas não tem tanta certeza sobre o estado do menisco. Tal como ele, foram assistidos no Garcia de Orta outros quatro jovens, entre os quais uma rapariga, magoada no nariz.

Eles [o Pelotão de Intervenção Rápida] entraram e arrearam em tudo o que viam à frente. Dois ou três colegas meus foram atingidos nas pernas e na cara. O Gustavo, embora longe do local onde começara a briga, apanhou por tabela. Foi o caos, quem estava na festa saltou o gradeamento e tentou a fuga, adiantou, afirmando-se surpreendido com o facto de a GNR ter chegado poucos minutos após o início dos desacatos. Tinham escudos e bastões e vi que pelo menos um segurava uma caçadeira.

NÃO IMPEDIRAM A ENTRADA

O quartanista de Engenharia Civil, habitué das festas na FCT, disse nunca ter presenciado uma acção policial tão violenta, muito menos dentro do espaço universitário. Em todas as festas há um ou outro desentendimento, mas passa depressa. Não é preciso que venha a polícia.

Duas patrulhas do posto da GNR da Trafaria contactado por vizinhos da FCT incomodados com o volume da música tinham estado antes no recinto, sem desenvolver outra acção além da troca de palavras com os jovens, universitários ou não, pois na festa entrou quem pagou. Mas, à terceira chamada, apareceu o Pelotão de Intervenção Rápida (PIR) da GNR de Almada.

Fonte daquela força de segurança admitiu a entrada dos militares da GNR na faculdade, alegando que a direcção da mesma não tentou impedi-los.

Quanto à mobilização do PIR, um corpo especializado na manutenção da ordem pública, deveu-se à presença de milhares de pessoas no local. Por outro lado, segundo o responsável, os militares do posto da GNR da Trafaria tinham antes sido insultados por alguns convivas, exaltados e sob efeito do álcool, que também tentaram agredi-los.

A mesma fonte admitiu que foram desferidas algumas bastonadas, afirmando contudo desconhecer que tivessem causado ferimentos que requeressem tratamento no hospital. Da acção do PIR não resultou qualquer detenção.

UNIVERSIDADE NEGA AUTORIZAÇÃO DE INTERVENÇÃO

O reitor da Universidade Nova de Lisboa (UNL), Leopoldo Guimarães, garantiu ao CM que não houve autorização quer da reitoria quer da direcção da faculdade para a entrada do corpo policial nas instalações da Faculdade de Ciências e Tecnologia. Leopoldo Guimarães acentuou que a GNR não pode entrar no recinto sem a autorização prévia dos dirigentes e responsáveis da faculdade e universidade, pelo que considera a actuação do Pelotão de Intervenção Rápida da GNR uma invasão abusiva.

O reitor da UNL afirmou que a festa dos caloiros foi devidamente autorizada pelos órgãos de gestão da Faculdade. Mostrando-se agastado com a intervenção policial, Leopoldo Guimarães anunciou que vai ser elaborado um inquérito, que será levado até às últimas consequências.

Ao fim de 30 anos na Universidade Nova, disse, foi a primeira vez que aconteceu uma invasão deste tipo, lamentando que a carga policial tenha originado feridos.

Quem sofreu na pele algumas investidas policiais contra estudantes foi o fiscalista Saldanha Sanches, que entrou para a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em 1963. As causas são muito diversas, não tem nada a ver com as bastonadas que levávamos antes do 25 de Abril, apenas é um reviver na forma.

Saldanha Sanches considera que actualmente não há razões para que a polícia não entre numa universidade, se for necessária a sua presença. Isto porque, afirma, as universidades são locais de investigação e de trabalho e se numa festa os estudantes se embebedam e há excessos, a polícia deve actuar como actua em discotecas ou boîtes.

LICENÇAS E EXPLICAÇÕES AO MINISTÉRIO

A Associação de Estudantes da FCT da Universidade Nova de Lisboa, que organizou a festa final da Semana do Caloiro, tenciona pedir explicações ao Ministério da Administração Interna acerca da carga policial ontem verificada dentro do espaço universitário.

Alguma vez se viu uma coisa assim: polícia especial no campus a bater nos alunos que estão a participar numa celebração?, questiona, indignado, João Pina, presidente da Associação de Estudantes (AE) da FCT.

João Pina reconheceu que faltava à AE a licença de ruído, necessária em situações como a descrita, com a música em volume muito elevado, garantindo, contudo, que podia apresentar a autorização camarária. Não naquela altura, porém. Quem tinha a chave do sítio onde a licença tinha sido guardada não estava lá no momento, mas eu garanti à GNR que apresentaria a autorização no dia seguinte, afirmou o dirigente.

O argumento não colheu junto dos militares. Disseram-me que a música tinha de acabar às 4h00 e eu assim fiz. Pouco depois, garante, quando os jovens desmobilizavam, dois grupos envolveram-se em briga. E os elementos do Pelotão de Intervenção Rápida começaram.




» Comentários

Domingo, 2 Outubro


- Iscspiana
Há aqui comentários absurdos! Não sou aluna da FCT mas estive na festa e vi muita gente simplesmente a divertir-se sem qualquer problema. Pagamos 200cts/ano e temos direiro ao divertimento não? Quem não esteve lá, não viu os seguranças a levarem da GNR pois não?! E outra coisa: a FCT fica praticamente num descampado... o que terá dito a população à volta do Técnico na 6a com o Arraial? 3ºmundo é o que é!

- Ricardo Pereira
Eu só gostava de saber uma coisa! Aonde é que anda o corpo de intervenção quando realmente é preciso? Assaltos, roubos violência nas ruas e polícia nem vê-la! E foram meter-se na fct aonde estavam todos simplesmente a divertir-se sem fazer mal a ninguém! E ainda dizem estes senhores da autoridade que merecem respeito? Respeitaram aqueles que estavam na festa?

- Milton- aluno da UNL/FCT
Eu estive lá e tenho vergonha de pertencer a um país onde a polícia agride indiscriminadamente pessoas que estão apenas a divertir-se. Já os "cidadaos" que estão para aí a "opinar" deviam era levar com umas valentes bastonadas na cabeça para ver se de uma vez por todas conseguem formular opiniões devidamente fundamentadas.

- André - FCTense
Como aluno da FCT e como cidadão português, venho por este meio mostrar o meu pesar ao estado deste pais quando se dá porrada a estudantes e palmadinhas nas costas a traficantes. Estive na festa, sai antes do sucedido, mas eram 4h e todos se divertiam sem nenhum problema! Queria também dizer que na festa não existiam só estudantes, quem paga-se o bilhete tinha direito a entrar! A polícia pagou?

- João Silva - aluno 19199
Não percebo porque é que esta notícia gera uma discussão sobre propinas. 900 anuais isolados, são problema para muito poucas pessoas. Agora, o que é um problema são 900 anuais + alimentação + transportes todos os meses. E não acho que ter dinheiro para a festa tenha que ver com o caso. A bebida/festa é acessória, logo deve ser paga. A educação é essencial, logo NÃO DEVE SER PAGA. Tenho dito.

- paulo-setubal
Coitadinhos dos estudantes, andam sempre a reclamar que são caras os propinas, ando eu a pagar impostos para eles estudarem e depois quando é para gastar em álcool com fartura nunca falta dinheiro... por isso o país vai de mal a pior. É esta a geração que um dia vai governar o país.... Tenham dó e respeitem os outros, inclusive a as F. de Segurança.

- Jerónimo Cunha
Peço a todos os que aqui deixam comentários PARA NÃO COMENTAREM O QUE NÃO SABEM, culpar os estudantes é fácil mas antes de abrirem a boca pensem no que vão dizer. Li comentários de pessoas que nada sabem altamente vergonhosos. Foi grave o que se passou e culpa da GNR que não teve a melhor atitude, abuso de autoridade foi o que se passou, e falo com conhecimento de causa.

- Henrique Braz Falcão Ferreira - Aluno nº13450 da FCT/UNL
Além disso, a partir do momento que for crime apanhar uma bebedeira, punido com uma carga policial, não tenhamos hipocrisias, todas as pessoas que estão a louvar a acção da polícia já tinham levado porrada. Não digo que não tenha havido quem tenha insultado polícias. Digo que eles carregaram sobre os 99% que não tinham.

- Nuno
O q se passou na 6ª foi um autêntico atentado à classe estudantil, agredir gratuitamente, onde já se viu...

- Manuel Pimenta nº17433 FCT-UNL
Para q de facto o barulho chegasse aos prédios circundantes, teria de ser insuportável para os presentes e é tb de reprovar a chamada da GNR em primeiro lugar. A sua intervenção tendo em conta a existência de licença é de condenar. E a sua postura claramente agressiva para com tudo e todos é de investigar em profundidade, pq ninguém ker ouvir a desculpa da nação: a geração rasca...

- Manuel Pimenta nº17433 FCT-UNL
É normal a presença de indíviduos estranhos à faculdade tendo em conta q esta festa é de acesso não-restrito, e esses mesmo indivíduos mtas vezes são de postura "duvidosa", dado o facto de estarmos situados na Margem Sul, no Monte da Caparica, e os desacatos por eles provocados são uma constante nas festas da faculdade, e os seguranças, Q CONHECEM OS ALUNOS E OS NAO ALUNOS, sabem o q fazer!

- aluna fct
A polícia entrou no campus por voltas das 2h00, o que altera muito a razão porque entraram na FCT. Sobre a actuação dos polícias acho indignável, os alunos não são nenhuns criminosos a ponto de serem agredidos! Tenham esta "atitude" nos sítios certos! (Almada)

- Manuel Pimenta nº17433 FCT-UNL
Antes demais gostaria de referir q estive na festa em questão mas retirei-me antes da tão falada invasão policial. Ora não foi o meu espanto qdo vários colegas meus me ligaram a relatar o q se tinha passado.

- Rui
Invasão de propriedade não consentido e abuso de autoridade, estes foram os únicos crimes praticados naquela noite, naquele sítio. Só se enganaram nos criminosos.

- Luís Barros
O P.I.R., o que gosta mesmo, é de ir desancar no pessoal, e ainda vejo aqui comentários de pessoas, que parecem definitivamente retrógadas, a chamar "coitadinhos" num tom sarcástico. Um dia, foram ao café, jogo de futebol na tv, há confusão no café, qual não é o espanto quando vêem parar uma carrinha carregada "deles" e levam por tabela, já viram que azar só queriam relaxar... coitadinhos.

- Fox
Kem n esteve presente pk escreve? O ke se passou foi uma vergonha. O barulho n se ouvia nos extremos do campus qt + fora da faculdade. Polícia pk? Keriam acabar com a festa? Já tinham conseguido! Keriam bater? Pk numa faculdade onde só se encontravam jovens a divertirem-se? A faculdade tinha mt seguranças e ke já se encontravam a separar as pessoas da confusão, seguranças ke acabaram por levar tb.

- aluna fct
Uma vergonha é o que se pode dizer em relação ao que aconteceu!

- Joao Trindade
Eu acho inadmissivel a polícia ter invadido uma faculdade e batido nos estudantes. Tantas mortes, tantas brigas que há na rua e onde é que eles andam? Mas para bater nos estudantes não pensam 2 vezes. Esta justiça vai de mal a pior.

- Tiago Lamelas
Como explicam, que antes de kualker acção policial , já estavam destacados para o local vários carros patrulhas e a polícia de intervenção rápida? Axo muito difícil o motivo ter sido o ruído, pois a festa é feita no centro do campus e a habitação mais perto deve estar a 700m (eu não ouvi barulho nenhum no parque de estacionamento).

- aluno fct
Acho piada aos comentários que dizem que a culpa é dos estudantes! São pessoas frustadas que não sabem sequer o que é a FCT. Não sabem onde fica (assim saberiam que a habitação mais próxima fica no mínimo a + de 1000m) e não sabem o seu prestigio. Não percebo o problema de haver álcool numa festa. Podemos aproveitar antes de exames e trabalhos?

Blatant copying' in coursework

(Última edição: quinta-feira, 3 de novembro de 2005 às 10:28)
Last Updated: Wednesday, 2 November 2005, 13:08 GMT o.gif
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'Blatant copying' in coursework
student writing
Examiners wondered how much was students' own work
Examiners say they detected "blatant copying of material from the internet" in some of this year's coursework for GCSE English.

Staff at the AQA exam board are said to have been surprised at some of the more obvious examples.

They also said some schools gave students so much help it amounted to "a kind of mass plagiarism".

Another board, Edexcel, said teacher guidance stretched or even went beyond what was acceptable.

Disqualification

The Qualifications and Curriculum Authority (QCA) watchdog is shortly to publish the results of a two-year inquiry into cheating in school exams.

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start_quote_rb.gif Often moderators would find several paragraphs beginning with exactly the same sentences, and paragraphs would be arranged in identical order end_quote_rb.gif
Examiners' report
Coursework is expected to be one of the main areas identified as a problem.

The AQA examiners' report deals with the version of the board's English syllabus taken by most candidates this June - more than 424,000 in all.

It said there had been considerable publicity about the availability of essays on the net.

Moderators - who check samples of the coursework which has been marked internally by schools - "found some quite serious instances of blatant copying of material".

They warned that candidates found to have cheated would always be reported and in serious cases most probably would be disqualified.

"Moderators have expressed some surprise at the more obvious examples they have seen," the report said.

The style of some written pieces was so different from the rest of the candidates' work they wondered how teachers had failed to challenge it, especially as they knew the candidates much better than the moderator.

'Scaffolding'

In some schools many candidates responded to a set text in such similar ways it was hard to tell them apart.

"Often moderators would find several paragraphs beginning with exactly the same sentences, and paragraphs would be arranged in identical order."

Schools are allowed to use "scaffolding" - giving students an outline of the structure, to marshal their thoughts.

"Scaffolding is undoubtedly an effective strategy for helping students to structure writing," the examiners said.

"But a distinction has to be made between using scaffolding as a teaching tool for individual learners and using it en masse with classes for a single task which is going to be submitted for assessment."

They felt that in many cases it restricted candidates rather than helping them.

"In the most severe cases, moderators found themselves having to make judgements about whether there was so much scaffolding and so little of the candidate's work that it was a kind of mass plagiarism."

'Teaching by numbers'

AQA's staff were not alone in having concerns.

At Edexcel, examiners said there were very few examples of blatant plagiarism, though it was "still very much an issue".

They added: "More insidiously worrying is the growth of what one moderator described as 'teaching by numbers' and there were other references to 'over reliance on teacher notes' and 'similar responses within a centre'.

"In such cases teacher guidance to candidates stretches what is acceptable to the limit (and beyond) by providing over detailed essay plans, which specify what should go in each paragraph, including the points to be made and the quotations to be used," their report said.

Among other things this made external moderation very difficult, if not impossible, "because it is unclear what work is the pupil's own".

Edexcel's design and technology examiners saw more instances this year of candidates writing "unsuitable and inappropriate comments about their teachers and the exam in general".

They added: "This must be discouraged as it can be, and in some cases, it is, very offensive."

O mestre dos silêncios, Miguel Sousa Tavares

(Última edição: sábado, 5 de novembro de 2005 às 07:32)
O mestre dos silêncios, Público, 4 Nov 2005

Mário Soares como ele
próprio não se cansa de
recordar, a título de prova
de vida passou estes dez
últimos anos sem resguardo algum: fez
uma fundação, foi deputado europeu,
publicou dez livros (!), viajou, fez conferências,
palestras, presidiu a comissões,
desfilou contra a Guerra do Iraque.
Puf! suspira Cavaco Silva, com desdém,
ao relembrar as andanças do seu rival
, um político profissional no seu pior!
Ele, Cavaco, fez o inverso: tratou de acabar
a sua vida académica tranquilamente, publicou
um livro, após sair do governo e onde
inventariou as reformas de uma década,
que jura ter feito, mas que, curiosamente,
são hoje universalmente reconhecidas
como as mais urgentes ainda por fazer, e
reservou-se para ocasionais aparições públicas,
sempre devidamente publicitadas
pelos inúmeros homens-de-mão que deixou
semeados pela imprensa e sempre recebidas
pela pátria como verdadeiros textos de
referência, senão mesmo de culto.
Soares falou tanto nestes dez anos que
não nos lembramos de coisa alguma marcante
que tenha dito. Cavaco falou tão pouco
que, para a história, ficou apenas aquela
frase dos tempos de governação de Santana
Lopes de que a boa moeda deve afastar a
má. Foi um pensamento profundo e corajoso:
antes dele, ninguém ainda tinha
pensado numa coisa dessas e
ninguém ainda se tinha atrevido
a questionar os méritos
governativos de Santana Lopes
e do seu extraordinário séquito.
Disse também outra coisa (hoje
convenientemente apagada dos
registos pelos seus fiéis), estava
a sua amiga Manuela Ferreira
Leite a tentar controlar o despesismo
público e os défices
suicidários do Estado: disse que
o que era preciso eram políticas
keynesianas, de contraciclo e
acrescidas despesas públicas.
Há dez anos que todos sabíamos
que Cavaco voltaria
a candidatar-se à Presidência
da República, assim que Jorge
Sampaio desimpedisse o
caminho porque, tirando
o inevitável holocausto de 95,
contra o mesmo Sampaio, e a
que não tinha maneira de se
furtar, ele sempre foi homem
dos combates com vitória
assegurada à partida. Este
seu novo e ridículo tabu com
as presidenciais, este patético
arrastamento da notícia formal
da candidatura, quando já tudo
estava pensado ao pormenor e ele ainda
fingia estar em reflexão, só serviu para
demonstrar duas coisas: uma, que Cavaco
conhece e usa todos os truques da política,
que afecta desdenhar; outro, que entre os
seus truques preferidos está a gestão do
silêncio, até ao limite do possível.
Não há lugar mais político do que a
Presidência da República. É um lugar destinado
exclusivamente a fazer política, não
a governar ou a fazer obra. É por isso que
a candidatura de Cavaco Silva gera tanto
desconforto, tanta desconfiança e tanta
insegurança em tanta gente: porque quem
se candidata ao cargo se afirma, pessoal e
estruturalmente, contra a própria natureza
dele e, por conseguinte, nos deixa a tentar
adivinhar que agenda secreta será a sua,
uma vez na Presidência.
Sempre foi assim, também, nos seus dez
anos de governo. Cavaco Silva sempre desprezou
as ideias políticas, o debate, a ideologia,
a agenda, a definição de um horizonte
ou de um projecto para Portugal. Quando
questionado, respondia com os 1400 quilómetros
de estradas novas, os 210.000 carros
comprados, as 600.000 criancinhas nascidas
durante os seus anos de esplendor. Nunca
aceitou debates, nunca perdeu tempo com
o Parlamento, nunca se submeteu a entrevistas
difíceis. Quando precisava de cuidar
da imagem ou da mensagem, reservava-se
para entrevistas exclusivas na televisão pública
com o seu conselheiro de imagem ou
com a sua adida de imprensa. Assim criou
o mito do homem infalível, demasiado ocupado
a resolver os problemas do país para
se desgastar em explicações avulsas ou na
inútil encenação democrática.

Para essas tarefas menores, Cavaco
contou sempre com um fiel exército de
guardas da revolução, que hoje reemergem
outra vez à superfície, tal como,
diga-se em abono da verdade, reemergem
os cortesãos de Soares. Uma das especialidades
de Cavaco Silva foi sempre a de dar
homens por si. Se Cavaco nunca teve uma
ideologia nem sentiu necessidade de a ter,
o cavaquismo teve-a.
Para quem já esqueceu ou finge ter
esquecido, convém relembrar o que era a
substância intelectual e política do cavaquismo.
O mesmo Cavaco Silva que hoje
se afirma contra a partidarização do aparelho
do Estado, foi o primeiro-ministro que
inaugurou a moda recente de distribuir
todos os cargos públicos (excepto os das
forças de bloqueio, que se lamentava
de não conseguir controlar) pelos fiéis
do partido e do chefe, enquanto ele, como
escreveu o seu fiel António Pinto Leite,
afectava dedicar-se unicamente ao culto
solitário e obsessivo do interesse nacional.
Enquanto o próprio Cavaco Silva se
vangloriava de ter devolvido Portugal ao
mundo e se gabava de ter feito de Portugal
um oásis de progresso no meio da decadência
do mundo, os seus fiéis ocupavam,
sem pudor nem temor, todos e cada um dos
cargos do Estado, das empresas públicas,
das sinecuras regionais. Na RTP, totalmente
governamentalizada, Roberto Leal,
vestido de minhoca branca, pulava e saltava,
cantando o refrão nós já temos Cavaco
e maioria antes mesmo das eleições.
E o ministro Fernando Nogueira, então
número dois e delfim do cavaquismo,
explicava candidamente que não havia
ocupação alguma do aparelho de Estado,
já que ele não conhecia um génio, uma
pessoa invulgarmente dotada, que não
esteja ocupada. Ele, por exemplo, estava
apenas muito empenhado em dar a sua
contribuição individual para um projecto
colectivo protagonizado pelo Professor
Cavaco Silva... numa unidade ideológica
que causa inveja aos adversários. Porque
tudo se resumia a essa tarefa patriótica
da unidade ideológica e serviço ao chefe,
como ensinava aos deputados do PSD o
líder parlamentar da maioria de então,
Montalvão Machado: Uma das prioridades
dos deputados sociais-democratas
deve ser a promoção da imagem de Cavaco
Silva. Eram os tempos, recordo, em que
o primeiro-ministro, Cavaco Silva, abria
o telejornal da RTP, então estação única e
pública, para declarar: Estou em condições
de dizer aos portugueses que o preço
da gasolina vai baixar quatro escudos por
litro. E eram os tempos, também, em que
o mesmo primeiro-ministro propunha
uma Lei do Segredo de Estado, felizmente
abandonada, em que os aumentos de
preço dos combustíveis, dos impostos,
das taxas de juro e outros rendimentos
do Estado, bem como a contracção de
empréstimos por parte da República
ou das Regiões Autónomas, passariam
a constituir matéria abrangida pelo segredo
de Estado. Assim ia a democracia,
nos gloriosos tempos de então.
E é por isso que, lembrando-me de coisas
de então, agora que, segundo as sondagens,
Cavaco Silva se prepara para ser meu Presidente
da República nos próximos dez anos,
eu acho que chegou a altura de lhe exigir
o fim do silêncio conveniente. Gostaria de
saber o que pensa ele de Portugal: da justiça,
da educação, da desordem territorial,
da reforma da administração pública,
da regionalização, do aborto, da Ota e do
TGV. E o que pensa do mundo: do Iraque, do
combate ao terrorismo, das relações com os
regimes corruptos de África, da imigração,
da adesão da Turquia à Europa, da deslocalização
de empresas, da futura guerra
contra o Irão. Numa palavra, gostaria de
saber que ideias tem ele, o não-político,
sobre a política. Será pedir de mais a quem
quer ser Presidente da República?

P.S. Nos tempos do Grande Ceausescu,
andava em reportagem pela Roménia
e pedi uma entrevista ao ministro
dos Estrangeiros. Responderam-me que
as perguntas só por escrito, previamente,
e as respostas só por escrito, posteriormente.
O mesmo sistema acaba agora de ser
instaurado na Câmara do Porto pelo dr.
Rui Rio. Gostavam muito da maneira de
fazer política dele, não gostavam? Pois
agora aprendam! ■ Jornalista

Please sir, can we have some more?

(Última edição: sábado, 5 de novembro de 2005 às 15:42)
Please sir, can we have some more?

Virtual learning environments are getting kids excited about education. Teesside pupils have developed an appetite for a piece of software called Moodle - and grades have improved as a result. Irene Krechowiecka reports

Tuesday October 4, 2005
The Guardian

When Darren Smith returned to work at Egglescliffe school in Teesside after a couple of months' absence, his pupils were pleased to see him, of course, but their most pressing question was would they be able to continue using Moodle? While Smith had been off sick he'd kept in touch with exam classes, setting and marking work remotely, courtesy of this brilliant piece of software. Brilliant because it's simple to use, is designed for educators by educators, has an ever growing range of powerful features and, perhaps most important of all, is open source (free).
"When I realised I'd be off for a while I decided using a virtual learning environment (VLE) would enable me to keep working with pupils. Moodle appealed because I could use it straight away without going through lots of sales. The pupils responded really well, with many spending considerable time out of school working through materials again and re-reading comments I'd made on their work. The results were good that year - in the GCSE class everyone got C or above and there had been several borderline students."

Teachers can use Moodle to publish course materials, set up discussions, send messages, hand out and mark assignments, create self-marking tests, and have live chats or one-to-one private discussions with their pupils. Students can access their courses from any internet-linked computer and everything anyone does is logged - even if they tell you they spent hours struggling with a task, there's a foolproof way of checking.

Smith was worried that pupils might find this intrusive but that's not so: "They see it as being of benefit. Moodle has now spread across the school, and resources and homework for most subjects can be accessed on line. Parents often worry that, when children say they're using the internet for homework, they're really playing games, but the Moodle logs show that's not the case."

The word, Moodle, is an acronym for modular object-oriented dynamic learning environment. But for its Australian creator, Martin Dougiamas, it's also a verb that describes "an enjoyable tinkering that leads to insight and creativity".

When Dougiamas started work on Moodle he imagined it would largely be used by higher education. So he's been surprised to find the biggest user group around the world are secondary schools. "They've turned out to be a vocal bunch and have driven a lot of the recent changes, which is great. Change, collaboration and learning from each other are very much features of any open source community. Software works better when it's free, a concept that can be hard to grasp if you're used to paying for it."

He's passionate about the idea of Moodle remaining free: "It feels wrong to put a cost on educational software. Not only does it open up experimentation and contributions from the community, but software costs nothing to replicate once you have written it. I prefer to find other ways to fund development."

The ethos of collaboration has spread to Moodle content, too. Darren Smith has made all the ICT courses he's created for years 7, 8 and 9 freely available for download from www.e-subjects.co.uk. These zipped files can be dropped into Moodle and Smith hopes that, as other teachers edit and change his work, they will likewise share, creating a repository of high-quality teaching materials.

Teachers involved in the new DiDA ICT qualification will soon be able to drop the free materials being developed by North West Grid for Learning into Moodle. The DiDA-delivered materials use technologies such as 3D Game Based Learning and chromakey video. To register an interest use the "contact us" section at http:// dida.nwlg.org.

In a virtual world it's easy to blur the distinction between who is the learner and who is the teacher; several schools have experimented by allowing pupils editing rights so they can work alongside teachers, creating and designing courses. At Perins school in Hampshire, Moodle courses are being developed by a team of students (gurus) and teachers (specialists). The gurus come from years 7 -11, and are led by year 10 and 11 ICT students.

Gideon Williams, head of ICT, says there is no problem with giving pupils full editing rights. "Students think it's a fantastic way to learn, and they provide great insight for the teachers because they know what works for them as pupils. We want to encourage independent learning and thinking, and Moodle is an excellent tool for this."

Amy Johnson, a year 11 guru, says she's really enjoyed working with teachers on the project: "We all learnt a lot about what lessons need to include and what students like in their lessons. Moodle gives everyone a chance to get their say about how and what they want to learn."

Colin Charde, the school's head of English, was suspicious at first. "I expected it to be another bandwagon, something I would forget about after the training, but it's not. It enhances teaching and learning and has become an invaluable tool."

Simplicity

Part of Moodle's appeal is its simplicity. It doesn't have special pages for editing purposes - as you're viewing a page you can make changes to it by turning the editing function on. Anyone who can create an email with an attachment has the skills to start using Moodle. As you delve into its potential there's more you'll want to learn, but it's extremely intuitive. The contextual help is excellent and the busy global message boards on the main Moodle site (http://moodle.org) provide answers to everything. For those who prefer their help notes as hard copy, Jason Cole's Using Moodle (O'Reilly Community Press) is a comprehensive guide. Buy it from www.helpusgettobett.com and you'll be helping the UK Moodle community's effort to pay for a stand at the Bett show.

Creating courses, no matter how intuitive the interface, is time-consuming. For those who want an easy introduction to the power of a VLE, Moodle offers some quick wins that save teachers time and extend their reach. Setting up message boards or chat sessions to support homework and revision takes little effort and is an effective way of providing out-of-lesson support - pupils often end up helping each other, with the teacher keeping an eye on what's happening.

At Parrs Wood in Manchester, Moodle was initially used to deliver personal development courses at key stage 3. Deputy head Jo MacKinnon chose Moodle because it was so user-friendly, quick to set up and adaptable. "We started using it to provide skills-based activities which students could work on in our independent learning centre when staff were absent. It proved effective and a growing number of teachers now use it for a range of subjects.

"This term we've moved to using it for all staff communication and the feedback from teachers has been very positive."

Parrs Wood also provides support to other schools interested in exploring Moodle through the Specialist Schools Trust ICT register (www.ict-register.net).

Os elementos fundamentais da cultura portugues, Jorge Dias

(Última edição: segunda-feira, 7 de novembro de 2005 às 12:58)

OS ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA CULTURA PORTUGUESA

Jorge Dias

No estado actual dos nossos conhecimentos não é possível desenvolver satisfatoriamente o tema que me foi designado neste Colóquio. Estabelecer os elementos fundamentais duma cultura representa o fim máximo a que a etnologia (antropologia cultural) se propõe; é, digamos, a cúpula dum edifício que ainda está nos alicerces. A vastidão e a complexidade do assunto não permitiram sequer que nestes escassos meses se pudesse traçar uma visão panorâmica da cultura portuguesa com a solidez científica indispensável. Pode dizer-se que tal tema é a tarefa de toda a vida daqueles que se lhe dediquem. O mérito desta tentativa não será mais do que quebrar o encanto de penetrar num mundo que a todos atrai, mas onde ninguém ousa afoitamente entrar, pelos perigos que encerra. São de molde a assustar qualquer um os juizos precipitados ou superficiais, de sobejo conhecidos, emitidos por vários jongleurs do espírito, que pretendem classificar um povo salientando só algumas características, muitas vezes bem pouco típicas, que mais se poderiam classificar anedóticas, quando não malevolentes.

Se definir os elementos culturais duma sociedade tribal demanda já um longo trabalho de análise e boas qualidades de observação, interpretação e síntese, o que não será estabelecer as bases culturais permanentes dum povo estratificado e com oito séculos de história? Aliás, não está mesmo demonstrada a permanência de características através do tempo, nem que a tradição cultural apresente a estabilidade rígida que muitos lhe atribuem. A herança cultural dum povo é fatalmente afectada por influências do exterior (aculturações) e por transformações de estrutura determinadas pela sua própria evolução'. Além disso, todos nós conhecemos a diversidade cultural das várias regiões naturais da nação portuguesa, agravada ainda pelas diferenças culturais próprias dos estratos sociais que a formam.

Posto isto, pode parecer que o problema se apresenta sem solução. É, contudo, indubitável que os vários povos mostram dife renças sensíveis entre si, que, embora difíceis de definir, nos garantem não ser em vão o esforço de o tentar. Creio mesmo que virá um dia em que o progresso dos estudos etnológicos permitirá uma síntese perfeita e cientificamente fundamentada do que é culturalmente especifico do povo português. Mas para isso é necessário abandonar as intuições mais ou menos brilhantes e os juizos superficiais ou aprioristicos e seguir um caminho penoso de análises sucessivas e de interpretações e sínteses parciais, até se poder alcançar esse fim superior que todos nos propomos.

Perante a dificuldade deste tema, cheguei a pensar fugir-lhe, limitando-me a apresentar aqui um método de estudo da personalidade-base e dos elementos fundamentais da cultura portuguesa. Era mais fácil, e seria talvez mais útil, começar por indicar o caminho que a investigação devia seguir perante a heterogeneidade cultural que se verifica no espaço (sincrónica) e no tempo (diacrónica), complicada ainda pela heterogeneidade vertical dos vários estratos sociais. Porém, embora venha em breve a publicar esse tentame metodológico, não quero iludir a dificuldade e vou-me esforçar por estabelecer, pelo menos, alguns dos elementos fundamentais da cultura portuguesa.

Quando nos referimos à cultura dum povo civilizado, formado por um conjunto de áreas culturais distintas e de classes estratificadas, não nos podemos necessariamente deter nas formas e instituições, e temos antes de lhe procurar o conteúdo espiritual. Só ele deixa compreender a evolução cultural do povo, porque só esse conteúdo espiritual pode ter carácter de permanência através das transformações morfológicas e ideológicas que se vão sucedendo no tempo. A única constante dum povo é o seu fundo temperamental, e não os múltiplos aspectos que a cultura reveste, porque é ele que os selecciona e transforma de acordo com a sua sensibilidade específica. Porém, nem sempre existe uma constante temperamental-base nas nações de composição heterogénea. Às vezes não há mais do que várias mentalidades em conflito real ou latente, que, com o decorrer da história, vão tomando alternadamente a orientação do conjunto. Convém compreender como tal fenómeno se passa, pois, muitas vezes, podem tomar-se como características dum povo aspectos culturais duma só região. Também pode suceder que tomemos por cultura nacional as características duma classe que deixou de ser a expressão superior de todo o povo, para ser simplesmente uma autocracia que impõe a esse povo normas de conduta e cuja cultura não corresponde à personalidade-base da nação.

Há povos em que a homogeneidade das partes que os constituem e a colaboração extensiva de indivíduos de todas as classes, por um elevado nível de instrução geral, tornam particularmente fácil o estudo da sua cultura. Estão neste caso, por exemplo, as nações escandinavas e a Holanda. Noutros casos, as diferenças regionais muito acentuadas impediram ou dificultaram a unificação, que só se fez tardiamente ou por imposição mais ou menos forçada duma dessas regiões sobre as outras. São estes, por exemplo, os casos da Itália e da Alemanha, onde ainda hoje se mantêm dialectos e formas de cultura superior que são simplesmente regionais. De qualquer maneira, a unificação das nações com regiões culturais heterogéneas tem de se apoiar num poderoso elemento polarizador das energias nacionais. A maior parte das vezes esse elemento é político e resulta da imposição, mais ou menos violenta, dos padrões de cultura duma província às outras que com ela formam um conjunto nacional. Na Alemanha foi a Prússia e em Espanha Castela que desempenharam esse papel unificador. Portugal, porém, apresenta uma curiosa particularidade de unificação. Embora a origem da Nação se deva também à política, à vontade dum príncipe, que naturalmente se aproveitou de certas aspirações de independência latentes nas populações de Entre Douro e Minho, a unificação e a permanência da Nação deve-se ao mar. Foi a grande força atractiva do Atlântico que amontoou no litoral a maior densidade da população portuguesa do Norte, criando como que um vácuo para o interior. Desde Caminha a Lisboa estabeleceram-se inúmeras amarras que defenderam Portugal da força centrípeta de Castela. Mas foi sobretudo o estuário do Tejo, esse forte abraço do mar com a terra, que definitivamente presidiu aos destinos de Portugal. Não houve o domínio duma região sobre outras, antes se encontraram todas num ponto natural de convergência. É por isso que, ao contrário de Berlim ou de Madrid, capitais no centro das regiões dominadoras, Lisboa, na foz do Tejo, está mais apoiada no mar do que na terra. Além disso, Lisboa pode dizer-se formada por habitantes oriundos de todas as provincias do País, quase que sem predomínio de qualquer delas. A este facto deve Portugal certa homogeneidade cultural permanente. Contudo, não devemos esquecer que, a par da cultura nacional, existem ainda hoje regiões naturais muito definidas, com culturas próprias bem caracterizadas, fruto, não só de condições ambientais diferentes, como de ascendência cultural e possivelmente étnica diversas'. Convém recordar que muitas características atribuídas aos Portugueses não passam de meros aspectos culturais duma só região. Se existe uma cultura com longa tradição, também é certo que são poucos os que nela participam, pois, por razões de educação e instrução, a maior parte da população recebe sobretudo a cultura tradicional da sua região.

A cultura nacional é um curioso fenómeno do espírito colectivo e resulta da combinação de muitos elementos. No momento em que na combinação entrem elementos novos, ou faltem outros, o composto que daí resulta já não pode ser o mesmo. Passa-se isto quase como num composto químico formado de elementos simples. O resultado não é a soma de todos eles, mas um corpo novo, com características próprias. Quer isto dizer que, se a cultura de um povo encerra em si, transformados, todos os elementos que a constituem (culturas locais), nem por isso esses elementos, tomados separadamente, permitem compreender o conjunto. Igualmente a perda de uma das partes ou a anexação de uma parcela nova acaba por afectar, com o tempo, as características da cultura nacional.

No caso especial português, a cultura superior não é também um somatório das diferentes culturas regionais, mas uma integração destas, de que resultou uma coisa nova em que elas estão contidas, embora transformadas por uma espécie de fenómeno de sublimação espiritual. Enquanto a cultura local tem carácter quase ecológico e resulta do conflito entre a vontade do homem, o ambiente e a tradição, a cultura superior transpõe esse conflito para o plano espiritual, porque o elemento ambiente natural é substituído pela história. Os factores mesológicos continuam a actuar, mas de maneira menos visível e, em parte, já contidos nas culturas regionais, que dão o seu contributo para a cultura superior. É possivel que, se um dia o nível de instrução e de educação for tão elevado que todo o povo participe mais intimamente na cultura nacional, desapareçam as culturas regionais, completamente absorvidas e sublimadas pelo espírito geral. Mas tal hipótese não se pode verificar, por enquanto, e temos de proceder cuidadosamente à análise das partes, sem cair no erro de as tomar pelo todo. A tendência a generalizar é um perigo frequente. Em Portugal muita gente julga os Espanhóis pelos centos de galegos que aí vivem e trabalham. Contudo, esses espanhóis são quase todos da Galiza, uma das provincias que mais se afastam da personalidade-base espanhola. É possível que tal erro de apreciação se repita noutros países em relação aos Portugueses. Os Brasileiros, os Americanos, os Franceses e os Marroquinos devem ter dos Portugueses uma ideia que corresponde principalmente ao Minhoto, ou ao Transmontano, ou ao Beirão, ou ao Açoriano, ou ao Algarvio, etc., e não ao Português-base.

Se para os estudos dos elementos fundamentais da cultura portuguesa tal distinção é menos importante, já se não dá o mesmo ao querer estudar as aculturações portuguesas fora do País. Para tais estudos convém conhecer em primeiro lugar as origens dessa colonização e fazer a análise cuidadosa da cultura da região donde provieram os colonizadores. Embora a Reconquista se tivesse feito do norte para o sul, e muitos territórios fossem repovoados com gente do Norte, ou esta se tivesse misturado em proporções várias com as populações existentes, isso não impediu que se formassem regiões culturais distintas. Contribuiu para isso não só o substrato cultural anterior, como a acção dos agentes naturais, diferentes nas várias regiões. Se os factores mesológicos são insuficientes para explicar os fenómenos culturais, nem por isso podemos negar a sua acção profunda.

Como o carácter deste trabalho não permite entrar nos estudos regionais - degraus necessários para quem quiser chegar ao cimo donde se domina o conjunto -, teremos de abordar directamente a essência do problema e deixar para outra ocasião esse importante assunto.

A cultura portuguesa tem carácter essencialmente expansivo, determinado em parte por uma situação geográfica que lhe confe riu a missão de estreitar os laços entre os continentes e os homens. Este carácter expansivo tem raízes bem fundas no tempo, se quisermos lembrar a cultura dolménica, que, segundo grandes autoridades, teve como centro de difusão o litoral português nortenho'. Porém, a expansão portuguesa, ao contrário da espanhola, é mais marítima e exploradora do que conquistadora. Desde muito cedo existem notícias de navegadores portugueses e, entre as medidas de fomento comercial-maritimo, distingue-se a criação da bolsa de mercadores, que veio a ser a primeira companhia de seguros marítimos mútuos (Companhia das Naus [século XIV]) .

A força atractiva do Atlântico, esse grande mar povoado de tempestades e de mistérios, foi a alma da Nação e foi com ele que se escreveu a história de Portugal. Como disse um professor alemão, a literatura portuguesa medieval já está cheia de motivos marítimos que se podiam procurar em vão em qualquer outra literatura latina'. De facto, antes de se empreenderem as grandes viagens oceânicas já o motivo marítimo impressionava a sensibilidade portuguesa. Porém, só mais tarde, depois de se ter levado a cabo a grande tarefa que a história universal nos tinha destinado, é que a arte portuguesa atingiu o seu máximo como glorificação das empresas marítimas. Os quatro pilares do génio criador português: Os Lusíadas, os Jerónimos, o Políptico de Nuno Gonçalves e os Tentos de Manuel Coelho, são quatro formas de expressão, verdadeiramente superiores e originais, dum povo que durante mais de um século esquadrinhou todos os mares e se extasiou perante as naturezas mais variadas e exóticas.

Se a situação geográfica contribuiu indiscutivelmente para o carácter expansivo da cultura portuguesa, ela só não basta para explicar tudo. Além dela, temos de considerar a feição psíquica portuguesa e a maneira como esta actuou perante as circunstâncias.

A personalidade psicossocial do povo português é complexa e envolve antinomias profundas, que se podem talvez explicar pe las diferentes tendências das populações que formaram o País. Da mesma maneira que Portugal representa o ponto de encontro natural das linhas de navegação entre a Europa, a África e a América, a sua população é constituída pela fusão de elementos étnicos do Norte e do Sul. Apesar da relativa homogeneidade da população actual, no Norte do País abundam elementos da Europa Setentrional e Central (celtas e germanos), enquanto no Sul predominam os elementos do Sul da Europa e do Norte de África (mediterrâneos e berberes).

Situado no extremo sudoeste da Europa, a poucos passos da África, o País estava destinado a ser ponto de passagem e de encontro das mais variadas raças, umas vindas dos confins do Mediterrâneo, como os Fenícios, que lhe demandaram os portos, outras cio extremo setentrião, como os Normandos, que lhe invadiram as costas. Mas as influências destes foram superficiais e só se fizeram sentir no litoral. Foram mais importantes as invasões celtas, sobretudo a partir do século VI a. C. Estes povos, senhores da técnica do ferro e da superioridade militar e económica que daquela derivava, acabaram por se fundir com a raça autóctone. Os Lusitanos, que resultaram desta fusão, eram um povo rude, sóbrio e espantosamente resistente e aguerrido. Era tal o amor da independência que os Romanos, quando quiseram conquistar a Península Ibérica, viram fracassar umas atrás das outras as tentativas para os dominar. Só ao fim de mais de um século, com a vinda de Augusto à Península, foi possível a subjugação deste povo, considerado um dos mais indómitos daquele tempo. Viriato ficou na história como um dos grandes heróis lusitanos e as suas campanhas chegaram a atingir o Norte de África, com a expedição de Kaukeno. Mas o Império Romano acabou por dominar inteiramente e, durante uns séculos, reinou a paz romana. Quando os povos germânicos, aproveitando-se da fraqueza do velho império, começam a invadi-lo em bandos sucessivos, modifica-se novamente a estrutura étnica e cultural das populações que correspondem ao Portugal actual. Logo nos começos do século V os Suevos distribuem terras entre si e se fixam na actual província de Entre Douro e Minho. Estes povos, saídos poucos anos antes do coração da Baviera, trouxeram com as mulheres e os filhos os usos e costumes e as técnicas agrárias do seu pais'. A pouco e pouco fundem-se também com as populações anteriores, formando um reino que tinha Braga por capital. O reino dos Suevos não pode resistir às investidas dos Visigodos, seus irmãos de sangue, mas mais práticos nas artes da guerra e da política. Os Visigodos acabam por se assenhorear de toda a Península, durante o século VI, formando um grande reino cristão. Porém, logo nos princípios do século VIII, os Árabes, movidos por um vivo impulso religioso, lançam-se na Península e conquistam-na com rapidez vertiginosa. Todavia, à medida que ganham em extensão, vão perdendo em ímpeto e, ao fim de alguns anos, o núcleo de resistência cristã, formado nas Astúrias, começa a repelir o inimigo. Vão-se assim formando novos reinos cristãos, entre os quais Portugal.

Portugal nasce desta luta contra os Mouros. É uma guerra política e religiosa. Enquanto se reconquista o solo da Pátria expulsa-se o inimigo da Fé. Atrás do conquistador vai logo o lavrador e constrói-se o templo. A espada que luta precisa de se apoiar no pão dos campos e na fé em Deus. Em 1249 acabava a luta porque não havia mais terra a conquistar, tinha-se chegado ao extremo sul da faixa portuguesa. Nesta ocasião já se tinha repovoado grande parte dos territórios e, além de muitas capelas românicas, já se erguiam as Sés de Braga, Porto, Coimbra, Lisboa e Évora. Era chegado o momento de ir mais além. Não no espaço, que não havia, mas na organização interna do País. Os reis que se seguem cuidam das letras, da justiça, e promovem medidas de fomento agrícola e de alcance marítimo. Em 1290 fundam-se os Estudos Gerais, o embrião da Universidade portuguesa. Nos fins do século XIII Portugal já exportava cereais. Parecia que tinham terminado as lutas e inquietações e que ia começar a vida próspera, pacifica e apagada dum pequeno povo à beira-mar. Mas não; os vizinhos Espanhóis começavam a cobiçar Portugal. Surgem novamente lutas e incertezas, que terminam pela vitória decisiva dos portugueses em 1385, no campo de Aljubarrota. Esta afirmação da força nacional parece ter despertado novas energias, e surge a ideia de ir contra o antigo inimigo de tantos séculos. Portugal já possuía então embarcações que lhe permitiam uma expedição militar ao Norte de África e, em 1415, os Portugueses conquistam Ceuta aos Mouros. Era o começo da fase de expansão marítima. Em 1418-19 descobre-se a ilha da Madeira, a seguir os Açores, depois vai-se explorando a costa africana com o propósito de chegar à índia pelo mar, ao mesmo tempo que se mandam exploradores por terra. Desde então, até aos nossos dias, toda a cultura portuguesa está impregnada de influências marítimas e ultramarinas.

A história de Portugal teve um período extraordinariamente glorioso, que definitivamente passou. Uma das nações mais pequenas da Europa foi senhora de um dos maiores impérios de todos os tempos e teve a maior armada da época. Embora Portugal ainda enfileire entre as grandes nações com territórios ultramarinos, todos nós sabemos que os destinos do mundo saíram há muito das suas mãos. A mesma sorte coube ultimamente a nações consideradas colossosos invencíveis. A grandeza e a decadência das nações tanto se devem à evolução íntima do seu povo como ao jogo dos acontecimentos. Às vezes, o que foram virtudes numa época podem ser defeitos noutra, e uma mutação de culturas pode alterar inteiramente os destinos às nações. O próprio temperamento português explica muitas das feições da sua história, mas há causas exteriores que também nos dão a chave de culpas que lhe são injustamente atribuídas. Se o carvão e o aço, que constituíram a base da última fase da civilização ocidental, existissem no nosso subsolo, é natural que tivéssemos desempenhado um papel bem diferente daquele a que fomos obrigados. Mas um país que deu madeiras e pano para caravelas e foi farto de pão para uma população de menos de 2 milhões de habitantes pode não ter riquezas nem abundância para alimentar uma população que cresce vertiginosamente.

Vamos agora tentar definir as constantes culturais deste povo, já velho de tantos séculos, comparando as características culturais de nossos dias com aquelas que a história nos fornece, em função da sua personalidade-base.

O Português é um misto de sonhador e de homem de acção, ou, melhor, é um sonhador activo, a que não falta certo fundo prático e realista'. A actividade portuguesa não tem raizes na vontade fria, mas alimenta-se da imaginação, do sonho, porque o Português é mais idealista, emotivo e imaginativo do que homem de reflexão. Compartilha com o Espanhol o desprezo fidalgo pelo interesse mesquinho, pelo utilitarismo puro e pelo conforto, assim como o gosto paradoxal pela ostentação de riqueza e pelo luxo. Mas não tem, como aquele, um forte ideal abstracto, nem acentuada tendência mística. O Português é, sobretudo, profundamente humano, sensível, amoroso e bondoso, sem ser fraco. Não gosta de fazer sofrer e evita conflitos, mas, ferido no seu orgunho, pode ser violento e cruel. A religiosidade apresenta o mesmo fundo humano peculiar ao Português. Não tem o carácter abstracto, místico ou trágico próprio da espanhola, mas possui uma forte crença no milagre e nas soluções milagrosas.

Há no Português uma enorme capacidade de adaptação a todas as coisas, ideias e seres, sem que isso implique perda de ca rácter. Foi esta faceta que lhe permitiu manter sempre a atitude de tolerância e que imprimiu à colonização portuguesa um carácter especial inconfundível: assimilação por adaptação. O Português tem vivo sentimento da natureza e um fundo poético e contemplativo estático diferente do dos outros povos latinos. Falta-lhe também a exuberância e a alegria espontânea e ruidosa dos povos mediterrâneos. É mais inibido que os outros meridionais pelo grande sentimento do ridículo e medo da opinião alheia. É, como os Espanhóis, fortemente individualista, mas possui grande fundo de solidariedade humana. O Português não tem muito humor, mas um forte espírito crítico e trocista e uma ironia pungente.

A mentalidade complexa que resulta da combinação de factores diferentes e, às vezes, opostos dá lugar a um estado de alma sui generis que o Português denomina saudade. Esta saudade é um estranho sentimento de ansiedade que parece resultar da combinação de três tipos mentais distintos: o lírico sonhador - mais aparentado com o temperamento céltico -, o fáustico de tipo germânico e o fatalístico de tipo oriental. Por isso, a saudade é umas vezes um sentimento poético de fundo amoroso ou religioso, que pode tomar a forma panteista de dissolução na natureza, ou se compraz na repetição obstinada das mesmas imagens ou sentimentos. Outras vezes é a ânsia permanente da distância, de outros mundos, de outras vidas. A saudade é então a força activa, a obstinação que leva à realização das maiores empresas; é a saudade fáustica. Porém, nas épocas de abatimento e de desgraça, a saudade toma uma forma especial, em que o espírito se alimenta morbidamente das glórias passadas e cai no fatalismo de tipo oriental, que tem como expressão magnífica o fado, canção citadina, cujo nome provém do étimo latino fatu (destino, fadário, fatalidade).

Este temperamento paradoxal explica os períodos de grande apogeu e de grande decadência da história portuguesa. Ao contrá rio do que muitos disseram, o Português não degenerou; as virtudes e os defeitos mantiveram-se os mesmos através dos séculos, simplesmente as suas reacções é que variam conforme as circunstâncias históricas. No momento em que o Português é chamado a desempenhar qualquer papel importante, põe em jogo todas as suas qualidades de acção, abnegação, sacrifício e coragem e cumpre como poucos. Mas se o chamam a desempenhar um papel medíocre, que não satisfaz a sua imaginação, esmorece e só caminha na medida em que a conservação da existência o impele. Não sabe viver sem sonho e sem glória.

Esta maneira de ser torna particularmente difícil a tarefa dos governantes, sobretudo em períodos históricos em que as circunstâncias não permitem desempenhar uma acção que lhes agrade e desencadeie as energias.

Nas épocas extraordinárias, quando acontecimentos históricos puseram à prova o valor do povo, ou lhe abriram perspecti vas novas, que o encheram de esperança, então brotaram por si, naturalmente, as melhores obras do seu génio. Porém, nos períodos de estagnamento nasce a apatia do espírito, a relutância contra a mediania, a crítica acerba contra o que não está àquela altura a que se aspira, ou cai-se na saudade negativa, espécie de profunda melancolia.

Percorrendo a história, podemos facilmente verificar como estas características apontadas se repetem em diferentes épocas, explicando certas acções e demonstrando a constância de alguns elementos fundamentais da cultura portuguesa.

Em todas as épocas se verifica o temperamento expansivo e dinâmico do Português. Sem ir à cultura dolménica, desde as épocas mais remotas, nos tempos em que a actividade era a guerra, os Lusitanos foram a expressão mais acabada da luta permanente e sem tréguas, que se prolongou pela Idade Média nas lutas da Reconquista contra os Mouros, para se transformar, finalmente, nas viagens de descobrimentos e de colonização. É também sintomático os Portugueses terem participado em grande parte das guerras europeias, mesmo quando não tinham interesses directamente ligados a tais conflitos. Até a série de revoluções fratricidas do século XIX e princípios do século XX provam o fundo de permanente inquietação e actividade. Porém, essa actividade traz sempre consigo um cunho de ideal. Quase nunca se verifica a acção precedida de cálculo interesseiro e frio. Embora não lhe falte, por vezes, um fundo prático e utilitário, o grande móbil é sempre de tipo ideal. Nas lutas da Reconquista não se procura só reaver o solo que os Muçulmanos tinham conquistado: lutava-se por um ideal religioso e expulsava-se o inimigo da Fé. A grande empresa marítima visa, é certo, a descoberta do caminho da índia e os negócios das especiarias, mas, além de se pretender dilatar o Império, pretende-se dilatar a Fé. A última ideia justificava a primeira, e não o inverso. Nunca soubemos separar o sonho da realidade, ao contrário do Inglês, que procede friamente, orientado pelo seu sentido prático. A maior desgraça da nossa história, a infeliz campanha de Alcácer Quibir, em que desapareceu D. Sebastião com a élite militar do seu tempo, não passou dum grande sonho vivido, de trágicas consequências. Mas a história está cheia de curiosos episódios, como o do Magriço e o dos Doze de Inglaterra, que vão defender em torneio umas damas ultrajadas por cavaleiros ingleses, a comprovar o fundo de sonhador activo do Português. Além disso, o desprezo pelo interesse mesquinho e o gosto pela ostentação e pelo luxo nunca nos permitiram o aproveitamento eficaz das grandes fontes de riqueza exploradas. Os tesouros passavam pelas nossas mãos e iam-se acumular nos povos mais práticos e bem dotados para capitalizar, como os Holandeses e os Ingleses. Soubemos traficar, mas faltou-nos sempre o sentido capitalista. No século XVI, quando Lisboa era o grande empério do mundo, sob o brilho do luxo já se ocultava a miséria. Gil Vicente descreve os fidalgos cobertos de rendas e brocados, com a sua coorte de lacaios, mas sem dinheiro para comer. O gosto pelas jóias, pela pompa, pelo luxo, é uma constante da nossa cultura. Desde as estações proto-históricas do Noroeste, tão ricas em magníficos exemplares de jóias de ouro, e, depois, nos períodos áureos, de que podemos citar a embaixada de Tristão da Cunha ao papa e as magnificências do reinado de D. João V, até aos nossos dias, tudo confirma o gosto pela ostentação e pelo espavento. Contudo, poucos povos têm menos necessidade de conforto do que o português. Ao contrário dos povos burgueses do Norte e Centro da Europa, o nosso luxo não é um requinte que resulte do conforto, é-lhe quase que oposto; é mero produto da imaginação, e não dos sentidos. Ainda hoje temos as camas mais duras da Europa, e as ruas estão repletas de automóveis de luxo. São poucas as casas ricas com aquecimento e muitas delas não têm uma sala de estar. Mas essas mesmas casas têm salas de visitas ou até salões de baile cheios de porcelanas da Índia e da China. As pessoas modestas, cujas casas são despidas do mínimo conforto, andam nas ruas vestidas com elegância ou com luxo. Um pequeno empregado do comércio, de pouca ilustração e educação, faz mais figura na rua do que um intelectual alemão ou suíço, de boa família e com recursos. Da mesma maneira, qualquer empregadita, que mal ganha para se alimentar, anda vestida impecavelmente e pela última moda. É tal a importância que se atribui ao exterior que, mesmo no Verão e no campo, as pessoas da classe média não se atrevem a tirar o casaco e a gravata. Só nos últimos anos, por influência do cinema e do desporto, isso vai sucedendo. Mas não se concebe que, por exemplo, um estudante universitário aparecesse nas ruas de calção.

Outra constante da cultura portuguesa é o profundo sentimento humano, que assenta no temperamento afectivo, amoroso e bondoso. Para o Português o coração é a medida de todas as coisas.

O sentimento amoroso é muito forte em todas as classes sociais e, fora o aspecto grosseiro, que se compraz em anedotas eró ticas, são inúmeros os exemplos de grande e profunda dedicação, acompanhada de gestos de verdadeiro sacrifício. Não só a história como a literatura nos dão a prova irrefutável da permanência desta característica através dos tempos. O exemplo mais curioso foi a grande paixão de D. Pedro por D. Inês de Castro, que nem a morte conseguiu extinguir e que ainda hoje serve de motivo poético e impressiona as sensibilidades. Na literatura basta lembrar a poesia medieval, tão sentida e original, em que com frequência se canta o amor da mulher pelo homem. A lírica de Camões, esse grande amoroso, dá-nos exemplos da mais bela e mais repassada emoção. As cartas de Soror Mariana Alcoforado, palpitantes de paixão veemen. te, os sonetos de Florbela Espanca, as poe. sias de João de Deus e muitos outros, sem esquecer a riquíssima poesia popular, parti cularmente impregnada de sentimento amoroso, são outras tantas afirmações desta constante da alma portuguesa.

Mas, além de forma puramente amorosa, a afectividade portuguesa revela-se em relação aos parentes, aos amigos e aos vizi nhos. O Português não gosta de ver sofrer e desagradam-lhe os fins demasiado trágicos. Daí talvez a pobreza do género dramática da nossa literatura e as soluções felizes que Gil Vicente soube dar a casos de traiçãc conjugal, que em Lope de Vega ou Calderón acabam em vingança sangrenta 9. Ainda hoje o público gosta dos filmes de happy ending. Outro aspecto curioso dessa característica são as touradas portuguesas, em que o touro não morre e vem embolado, para não ferir os cavalos nem matar os homens. O espectáculo perdeu a intensidade dramática que tem em Espanha, mas ganhou em beleza, pela valorização do toureio, e mantém a nota viril da coragem física com as pegas, em que os homens medem forças com o touro, que é dominado a pulso. Cabe aqui acrescentar que em Portugal não existe a pena de morte, certamente como consequência dessa maneira de ser.

Como representantes do sentimento humano na literatura, temos, por exemplo, Augusto Gil, João de Deus, Júlio Dinis, Trindade Coelho e António Nobre. É este sentimento que explica muitas atitudes desconhecidas noutros países e tão frequentes em Portugal, como a do filho a quem oferecem uma boa situação no estrangeiro e que renuncia por ver umas lágrimas nos olhos da mãe; prefere arruinar as suas esperanças à ideia de a fazer sofrer. É também ele que determina um sem-número de casamentos injustificáveis, em que o homem se sacrifica para evitar o desgosto a uma rapariga com quem namorou algum tempo. Quando vê o sofrimento que provoca a ideia do rompimento, decide-se a casar e aguentar toda a vida uma situação que não foi determinada pela íntima necessidade.

Contudo o Português não é fraco nem covarde. Detesta as soluções trágicas e não é vingativo, mas o seu temperamento brioso leva-o com excessiva frequência a terríveis lutas sangrentas. Quando o ferem na sua sensibilidade e se sente ultrajado, ou perante um ponto de honra, é capaz de reacções de extraordinária violência. São testemunho disso os jornais diários, que relatam rixas tremendas entre amigos e vizinhos. Antigamente, e hoje mais raramente, pela repressão que o Estado tem criado, as lutas entre aldeias vizinhas tomavam aspectos de batalhas campais. Mas, tirando o crime passional, são raros os casos de homicídio perverso. Não se conhecem vampiros, como no Norte da Europa, nem os assassinos que cortam as mulheres aos pedaços e os queimam ou deitam aos rios, como em outros países sucede.

A própria religião tem o mesmo cunho humano, acolhedor e tranquilo. Não se erguem nas aldeias portuguesas essas igrejas enormes e solenes, tão características da paisagem espanhola, que na sua imponência apagam a nota humana. A igreja portuguesa, ora caiada e sorridente entre ramadas, ora singela e sóbria na pureza do granito, é simplesmente a casa do Senhor. É sempre um templo acolhedor, habitado por santos bons e humanos. Não se vêem os Cristos lívidos e torturados de Espanha. A sensibilidade portuguesa não suporta essa visão trágica e dolorosa.

A prova mais evidente deste sentimento humano e terreno da nossa religiosidade verifica-se na extraordinária expansão do estilo românico, com o seu arco singelo bem apoiado na terra, e na falta de assimilação do estilo gótico. Nunca sentimos esse profundo arroubo místico, essa ânsia de ascensão que caracteriza o gótico. O nosso espírito assimilou mal um estilo cuja expressão nos era estranha. Em todos os monumentos arquitectónicos caracteristicamente portugueses perdura uma certa espessura dos pilares, uma nítida tendência para a profundidade e para a horizontalidade, contrária à ânsia de verticalidade ascensional do gótico. O espírito português é avesso às grandes abstracções, às grandes ideias que ultrapassam o sentido humano. A prova disso está na falta de grandes filósofos e de grandes místicos. Nem compartilha do racionalismo mediterrâneo, da luminosidade greco-latina, nem da abstracção francesa, de grandes linhas puras, nem do arrebatamento místico espanhol. Em vez das grandes catedrais góticas da França e da Espanha, ou dos templos clássicos da Renascença italiana, que não sentia, o Português acabou por criar um estilo próprio, onde a sua religiosidade típica melhor se exprime: o manuelino.

Foi no clima de exaltação dos descobrimentos marítimos que os elementos psíquicos dispares da população portuguesa se fundiram e alcançaram as suas expressões mais elevadas. O Atlântico atraíra sempre com a sua magia um certo fundo sonhador e vago das populações costeiras, enquanto as do interior se agarravam fortemente à solidez do solo conquistado. Nas cantigas de amigo perpassava já o perfume dos ventos do mar, enquanto nas pequenas igrejas românicas, fortemente fincadas no chão, se exprimia a solidez rústica duma crença firmemente enraizada na terra. Mas o Atlântico venceu. Os Portugueses lançam-se na grande aventura e desviam a civilização do Mediterrâneo para o Atlântico, mudando o curso à história universal. O velho do Restelo era o homem da terra em face da loucura marítima. Porém, solidário como nos tempos da Reconquista, quando ficava a cultivar as terras recém-conquistadas, o camponês também não falhou a colonizar as terras recém-descobertas. Apesar de a população metropolitana ser insignificante, a Madeira e os Açores começam a ser colonizados em 1425 e 1439, isto é, 6 e 12 anos logo após o seu descobrimento. Por fim descobre-se o caminho marítimo para a índia e toma-se posse oficial do Brasil 'o. O profundo sentimento da natureza, já patente na Lírica Medieval e na Menina e Moça, robustece-se em contacto com os grandes horizontes abertos, com as tempestades e com os mundos exóticos, povoados de animais e de gentes estranhas ". Os Lusíadas, que entusiasmaram Humboldt pelo seu enorme encanto ao descrever os fenómenos marítimos, são o grande poema do mar. Sente-se nele o deslumbramento do poeta e de toda a geração o que precedeu:
Digam agora os sábios da Escritura Que segredos são estes da Natura...
Perante a grandeza e os mistérios da natureza, que os Portugueses vão a pouco e pouco descobrindo, nasce uma atitude espe cial, não destituída dum certo fundo místico-naturalista, com tintas de panteismo. Não panteísmo filosófico, mas sentimental. O Deus que se adorava continuava a ser o mesmo, dentro da ortodoxia católica, mas o mundo por Ele criado era muito mais variado e rico. É então que surgem os Jerónimos como expressão arquitectónica máxima da religiosidade portuguesa. A grande novidade era a decoração naturalista, inspirada em motivos do mar e na exuberância da vegetação exótica. O antigo sentimento da natureza, que só encontra até então expressão poética, transporta-se agora para a forma plástica. Os templos enchem-se de elementos da natureza, impregnados de sentido religioso, de evocações de mundos longínquos e estranhos e dos mistérios do mar. Era natural que esse povo de marinheiros quisesse decorar os seus templos com as belezas do mundo recém-descoberto. Ainda hoje os pescadores rudes do Norte de Portugal costumam levar como ex-votos ao santo da sua devoção miniaturas de navios ou quadros alegóricos de qualquer naufrágio ou perigo de que escapam. Porém, se na decoração há novidade arquitectónica, a sensibilidade portuguesa manteve-se presa ao atavismo românico, na solidez das proporções e no arco redondo. A sua religiosidade rude e simples sente confiança num templo fortemente apoiado na terra, onde paira uma obscuridade doce que repousa o espírito.

O manuelino é, pela sua decoração, uma espécie de estilo barroco, razão por que Eugénio d'Ors diz que o barroco nasceu em Portugal '2. Contudo, no manuelino e, mais tarde, no nosso barroco falta por completo o movimento musical que se verifica noutros países, sobretudo na Áustria e nos arredores alpinos. Se o movimento é uma das características mais salientes do barroco, temos de ver que esse movimento toma entre nós uma feição especial que o afasta inteiramente do pais das valsas. É um movimento parado, uma espécie de imóvel « perpetuum mobile», como diz Santiago Kastner ao referir-se aos ostinati dos compositores portugueses ". De facto, a actividade portuguesa é de tipo flsico, embora seja determinada pela imaginação, mas há qualquer coisa de estático na emoção portuguesa. O fundo contemplativo da alma lusitana compraz-se na repetição ou na imobilidade da imagem.

Uma das características mais importantes da saudade é precisamente essa fixidez da imaginação, que, por intensidade, se pode tornar em ideia motora e conduzir à acção. A poesia medieval impressiona tanto pela imobilidade dos pequeninos quadros, que se repetem, que até houve quem lhe procurasse uma origem oriental". Além disso, a literatura portuguesa manteve até hoje o carácter lírico. A vocação para o género épico e dramático foi sempre menor, e até mesmo Os Lusíadas valem muito pelo seu fundo lírico. Os romances actuais são, da mesma maneira, falhos de acção, parados. Mas na música repete-se exactamente o mesmo fenómeno. Em quase todos os compositores se verifica a imobilidade, o apego a meia dúzia de desenhos musicais fixos, às sequências obstinadas. Falta-nos a animação própria dos Espanhóis e a predisposição para encadeamento de movimentos, frequente noutros povos. Diz Santiago Kastner a propósito de Duarte Lobo que este «logrou expressividade penetrante, que deriva antes da atitude contemplativa e do ensinamento do que do afã de dramatização estilizada e porventura excessiva» .

Não será isto, afinal, uma constante da alma portuguesa, que se revela particularmente neste compositor? O «ostinatismo» que se verifica na música erudita portuguesa, e que, parece, veio influenciar a música europeia da época, é um dos aspectos do temperamento português, que se pode notar em outras manifestações artísticas. O manuelino ´esse mesmo ostianismo tão português como marítimo, feito de ondas e de espuma e de vago apelo da distância. Onde há movimento mais imóvel que o das ondas a rolar os seixos das praias?

É possível que o fundo histórico da imobilidade e do «ostinatismo» da música erudita portuguesa sejam os intervalos paralelos e isométricos das canções corais alentejanas e minhotas, que na sua essência representam também a ideia do ostinato, mas a sua verdadeira origem deve estar na alma contemplativa e obstinada dos Portugueses. Foi a própria obstinação que tornou possível a realização dum sonho que parecia superior às forças daqueles que o realizaram. O manuelino, afinal, é a expressão arquitectónica desse sonho materializado; é, como disse Reinaldo dos Santos, a «arte dos Descobrimentos '°.

O «ostinatismo» tem, como a saudade, mais que uma face. Se por trás dele existe uma ideia grande pode ser fértil em resultados, pela sua enorme capacidade de penetração, de movimento em profundidade. Mas, sem esse amparo, tem o perigo de conduzir à imobilidade mental, ou ao movimento aparente e sem sentido, porque lhe alta a força de coesão social, que leva o 'ortuguês a ultrapassar o seu individualismo e a colaborar. De facto, o Português tem um forte sentimento de individualismo, que se não deve confundir com o de personalidade. Enquanto a personalidade anglo-saxónica ou germânica não colide geralmente com os interesses sociais e só preza a sua liberdade íntima, o Português, da mesma maneira que o Espanhol, tem uma forte ânsia de liberdade individual, que muitas vezes é anti-social. A tendência a opor-se a tudo que se lhe não apresente com carácter humano obriga-o a lutar contra as leis ou organizações gerais. Detesta o impessoal e o abstracto e põe acima de tudo as relações humanas. 0 seu fundo humano torna-o extraordinariamente solidário com os vizinhos, e em poucas regiões da Europa existirá ainda vivo como em Portugal o espírito comunitário e de auxílio mútuo`. Mas qualquer organização geral que limite as liberdades individuais produz imediatamente um movimento de reacção em que todos são solidários. Um pequeno exemplo anedótico verifica-se no costume de os automobilistas fazerem sinais com os faróis a todos os carros com que se cruzam, sempre que tenham visto a polícia das estradas, para os porem de sobreaviso. A policia, como representante da lei geral, é considerada como inimigo, e logo surge a reacção.

Da mesma maneira o funcionário, até quando veste uma farda e obriga a cumprir a lei, tem idêntica dificuldade em represen tar um papel impessoal. Esta tipica feição portuguesa dá origem a uma das burocracias mais rígidas que até hoje conheci na Europa. O funcionário menor agarra-se desesperadamente à letra da lei, sem tentar compreender-lhe o espírito. Qualquer caso menos corrente já o não quer resolver e atira-o para o seu superior hierárquico. Sente-se mal e pouco à vontade metido naquela camisa de forças, que o impede de ser ele próprio e de se apoiar no seu instinto humano. A própria tristeza e má vontade que, em geral, traz estampadas no rosto devem ser a consequência do violento esforço de adaptação a funções para as quais não sente vocação. Esta tendência a sobrepor a simpatia humana às prescrições gerais da lei fez com que durante muito tempo a vida social e pública girasse à volta do empenho ou do pedido de qualquer amigo. Pedia-se para passar nos exames, para ficar livre do serviço militar, para conseguir um emprego, para ganhar uma questão, enfim, para todas as dificuldades da vida. Hoje em dia tal hábito tradicional tem sido contrariado e já quase não existe. Porém, este fundo de simpatia que regula as relações entre os Portugueses está tão entranhado que até no comércio, onde o interesse se devia sobrepor a tudo, ele se verifica. Disse-me um vendedor alemão, que viveu muitos anos em Portugal, que para fazer negócio no nosso país era indispensável conquistar a simpatia do comprador. Uma vez isto conseguido, tinha-se a certeza de obter a preferência. Pelo contrário, noutros países, a única maneira de vender é oferecer maiores vantagens materiais, independentemente de toda a amizade pessoal.

É a sobreposição dos valores humanos ao lucro e ao utilitário que explica muitos capítulos da nossa história e que deixa compreender muitas formas da sociedade actual. Tal mentalidade é a negação do espírito capitalista. No campo, sobretudo, é ainda viva a mentalidade patriarcal, onde a mesa está pronta para quem se quiser sentar e onde se não nega o pão e o caldo ao mendigo que passa. De dinheiro podem ser avaros, mas não fazem as contas ao que é da sua lavoura. Chegam a vender coisas mais baratas do que elas lhes custam. Porém, nas próprias empresas comerciais e industriais existem ainda muitos casos de absoluta falta de racionalização. O Português gosta de fazer projectos vagos, castelos no ar que não pensa realizar. Mas no seu intimo alberga uma certa esperança de que' as coisas aconteçam milagrosamente. Esta forte crença no milagre, cujo aspecto mais grosseiro é a enorme popularidade do jogo da lotaria, chega a tomar aspectos curiosos, dos quais sobressai o sebastianismo. Todos esperavam que o rei D. Sebastião, morto em África, surgisse numa manhã de nevoeiro montado no seu cavalo de guerra. A crença viva é decididamente uma força, mas, quando toma aspectos irracionais e supersticiosos, pode ser uma fraqueza. Um dos aspectos maus e muito correntes é a crença na sorte: «Fulano tem sorte» e «eu não tenho sorte» servem para diminuir as qualidades dos outros e justificar a própria incapacidade.

A imaginação sonhadora, a antipatia pela limitação que a razão impõe e a crença milagreira levam-no com frequência a situa ções perigosas, de que se salva pela invulgar capacidade de improvisação de que é dotado. Quando se aproxima a catástrofe, abrem-se-lhe os olhos da razão, e então é capaz de desenvolver tal energia e com tal eficiência que a isso é que se poderia chamar milagre. O facto de se repetirem tais situações deve explicar-se pela confiança que o Português tem na facilidade das soluções da última hora. Nesses momentos a sua inteligência viva, a enorme capacidade de adaptação a todas as circunstâncias e o jeito para tudo permitem-lhe dominar as situações com êxito.

É ainda essa enorme capacidade de adaptação uma das constantes da alma portuguesa. O Português adapta-se a climas, a profissões, a culturas, a idiomas e a gentes de maneira verdadeiramente excepcional. 0 Português foi sempre poliglota. Já os nossos clássicos escreveram quase todos em mais de uma língua, e mesmo as pessoas de pouca ilustração aprendem e sabem com frequência falar um idioma estrangeiro. Mas a capacidade de adaptação é geral; podia ilustrar-se com inúmeros exemplos. É, porém, curioso que o Português se adapta a outro ambiente cultural tão bem que parece ter sido assimilado; mas volta para Portugal e em pouco tempo já não se distingue dos outros. Enquanto o Inglês fica sempre inglês em toda a parte, e o Alemão, quando deixa de o ser, dificilmente volta a tornar-se alemão, o Português assimilou completamente o provérbio que diz: «Em Roma sê romano.» Mas só enquanto está em Roma.

A capacidade de adaptação, a simpatia humana e o temperamento amoroso são a chave da colonização portuguesa. O Portu guês assimilou adaptando-se. Nunca sentiu repugnância por outras raças e foi sempre relativamente tolerante com as culturas e religiões alheias. A miscigenação portuguesa não tem só uma explicação sensual, embora a caracterize uma forte sexualidade. Ainda hoje o Português tem decidida inclinação por mulheres doutras raças e é capaz de mostrar grande afeição ou profundo amor. É célebre o amor de Camões por uma escrava, cantado em versos sentidos. Mas o Português não gosta só de certas raças, gosta de quase todas. Um dia, ao folhear um livro de registo de portugueses no consulado de Berlim, fiquei espantado com o elevado número de casamentos de portugueses com alemãs, e já tenho encontrado, mesmo em aldeias primitivas, mulheres francesas, espanholas e italianas (estas residentes no Brasil) casadas com antigos emigrantes.

O Português é menos exuberante, ruidoso e expansivo que os outros meridionais. Um só espanhol, numa carruagem de com boio, abafa com a sua voz a de todos os portugueses. Além disso, o Português é inibido por um forte sentimento do ridiculo. Como é muito sensível e dotado da faculdade de se aperceber do que vai nos outros, receia ser vítima da ironia e da crítica trocista, tão comum em Portugal. De facto, a ironia, muito mais do que o humor, tem fundas raizes na cultura portuguesa; desde as cantigas de escárnio e maldizer da Idade Média até à ironia de Eça de Queirós há toda uma gama de coloridos. Temos a ironia benévola de Gil Vicente, a mordente de Nicolau Tolentino e de Bocage e a ironia pungente ou sarcástica de Fialho e de Camilo. Mas o próprio povo, com as suas certeiras alcunhas e apelidos, ou com os apodos tópicos, ou com os cantares ao desafio, etc., mostra a terrível arma de que é dotado. Por isso, a sensibilidade, que é um dos grandes elementos positivos da mentalidade portuguesa, é também um dos grandes elementos da sua fraqueza. O sentimento do ridículo e o medo da opinião alheia abafam nele muitos impulsos generosos, deformam a sua naturalidade e impedem-no de se entregar livremente aos prazeres simples e à alegria espontânea. Nas classes populares tal sentimento é moderado, mas nas outras classes é tão saliente que se tornam com frequência ridículos pelo medo de o parecer. Tal sentimento complica-se pela consciência das glórias passadas, pelo desprezo paradoxal pelos valores burgueses e pela admiração pelas realizações alheias. O Português, muito intimamente, é incapaz de ambicionar para a sua pátria o bem-estar e a prosperidade que, por exemplo, o Suíço conseguiu pelo esforço pertinaz e constante. É certo que o Português se envergonha perante um suíço, pelo elevado nível de vida que aquele soube conquistar, mas se fosse ele o suíço, envergonhar-se-ia da mesma maneira, por ter conseguido um bem-estar sem glória.

É um povo paradoxal e difícil de governar. Os seus defeitos podem ser as suas virtudes e as suas virtudes os seus defeitos, conforme a égide do momento.