Economia, emprego e factor cultural | |
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Adelino Torres, Professor do ISEG DN, 11 de Abril de 2005 Cultura. Se, de facto, a economia é importante, é duvidoso que, por si só, resolva os problemas da organização da sociedade contemporâ-nea. Os dilemas culturais colocados pela evolução vertiginosa da ciência, da tecnologia e das ideias oferecem desafios urgentes a que apenas pode responder uma sociedade educada A propósito da crise fala-se muito de economia e de finanças e pouco desse outro pilar do desenvolvimento que é a "cultura", aqui tomada no sentido amplo do termo. Se, de facto, a economia é importante, é duvidoso que, por si só, resolva os problemas da organização da sociedade contemporânea. Os dilemas culturais colocados pela evolução vertiginosa da ciência, da tecnologia e das ideias oferecem desafios urgentes a que apenas pode responder uma sociedade educada. É por isso que um ensino exclusivamente orientado por uma óptica utilitarista estática, que não esteja, em particular, assente na investigação fundamental, revelar-se-á a prazo inoperante e mesmo factor de retrocesso se, como é previsível num sistema dinâmico, os mercados evoluírem, os objectivos mudarem e o tipo de empregabilidade se transformar radicalmente. Desde logo a educação não pode ter uma visão estreita virada para satisfazer apenas as "necessidades da economia" tal como por vezes a vemos, porque é grande o risco de muitas profissões ficarem rapidamente obsoletas e não corresponderem às "necessidades" da sociedade, do mercado e do Estado. Sem negligenciar uma determinada especialização e qualificação profissional, importa que se prepare antes de mais a juventude para a mudança, a qual implica abertura de espírito, curiosidade, autonomia, pensamento crítico e criativo. Em resumo tudo o que pressupõe cultura e competitividade. Também a "formação ao longo da vida" só é plenamente realizável se as pessoas tiverem ao menos um determinado nível de literacia (no sentido de "cultura geral") articulada com a faculdade de mudar. Essa literacia condiciona em larga medida a atitude e a capacidade dos agentes económicos no âmbito da "actualização de competência". Se assim for, limitar-se a avaliar a educação de um ponto de vista exclusivamente "prático" ou utilitarista (satisfazer as necessidades imediatas do mercado em nome de um "realismo" discutível) é uma aporia que pouco resolverá. Como alguém disse (Filipe Botton), não basta agir por reacção, é necessário fazê-lo por antecipação. O imediatismo não é bom conselheiro nem dará resposta aos problemas das empresas e menos ainda aos do país. Por outro lado, a cultura excede largamente o que a escola ensina. Na sociedade civil os meios audiovisuais, imprensa, TV, clubes desportivos, associações, partidos, internet etc. têm grande influência, infelizmente nem sempre com os melhores resultados. Por exemplo, certos canais de televisão confundem demasiadas vezes "popular" com rasca e "cultura" com obscuridade. É preciso desmistificar, sem demagogia, a trindade fatídica que, no espírito do cidadão médio, mistura cultura com obscuridade e com tédio, afastando-o em vez de o atrair, diminuindo-o em lugar de o fazer melhor. Em televisão há certamente cultura nos populares e pedagógicos programas do brasileiro Jô Soares, infinitamente superiores em humor e inteligência a programas portugueses congéneres, cujo conteúdo pode frequentemente ser classificado como "dissolvente" e anticultural, onde impera o snobismo, a mentalidade paroquial e as personagens patéticas tiradas de uma farsa tonta. Por seu turno os clubes desportivos poderiam aproveitar as suas "claques" para favorecer a civilidade e educação da juventude e não para promover tribos de desordeiros; enquanto que os partidos políticos ganhariam em dar às juventudes partidárias uma formação pluridisciplinar séria, em seminários de Verão, a fim de não favorecer a promoção de clientelas de oportunistas incultos sem sentido da causa pública. Com estas e outras melhorias, ajudar-se-ia mais seguramente a qualidade dos recursos humanos, a produtividade e a economia do que em descarregar sistematicamente as culpas todas sobre o ensino e a universidade onde finalmente não se trabalha tão mal como alguns dizem... | |
Em Portugal compensa ser licenciado | |
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Expresso, 29 de Outubro de 2005 | |
Ensino artístico é fundamental, António Damásio | |
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Ensino artístico é fundamental 2006/03/06 | 13:04 E não deve ser secundarizado face à Matemática e outras ciências, diz António Damásio O neurocientista António Damásio considerou hoje que o ensino artístico é fundamental para o desenvolvimento de bons cidadãos e que o seu papel não deve ser secundarizado nas escolas face à Matemática e outras ciências exactas, noticia a agência Lusa. O investigador radicado nos Estados Unidos, falava na Conferência Mundial de Educação Artística, que hoje se iniciou no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, onde durante quatro dias cerca de 700 participantes de 150 países vão estar reunidos para debater a educação artística a convite da UNESCO. «O teatro, a literatura, a poesia e outras artes criam emoções inesquecíveis e a sua aprendizagem é muito importante na criatividade, no desenvolvimento de capacidades ligadas à inovação», argumentou o investigador durante a primeira conferência deste encontro. Director do Instituto do Cérebro e da Criartividade da Universidade da Califórnia, António Damásio é professor de psicologia, neurociência e neurologia. Na sua intervenção, intitulada «Cérebro, Arte e Educação», o cientista alertou que, no mundo actual da globalização e grande velocidade de informação, as aptidões cognitivas das novas gerações desenvolvem-se muito mais rapidamente do que as suas capacidades emocionais e estas últimas são essenciais para a formação de cidadãos. «Sabemos hoje que as crianças afectadas nos seus sistemas emocionais não vão conseguir aprender as convenções sociais em adultos», disse, acrescentando que a sociedade não deve subalternizar o plano cognitivo ao plano emocional. António Damásio considerou «preocupante» o desfasamento entre o desenvolvimento do lado cognitivo, normalmente mais valorizado porque é associado à razão, e o lado emocional entre as crianças e jovens nas sociedades actuais e as suas consequências futuras. http://www.portugaldiario.iol.pt/noticia.php?id=654294&div_id=291 | |
Estou profundamente preocupado com a economia portuguesa | |
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DN Segunda-feira, 11 de Abril de 2005 Entrevista a Miguel Beleza A economia entrou uma fase dita de "reestruturação" com um desfecho ainda incerto. Concorda com esta análise de alguns economistas? Eu gostava de acreditar que as medidas e o programa a apresentar pelo Governo irão ter como resultado a recuperação do crescimento potencial da economia. Mas estou profundamente preocupado. Não estou muito optimista em relação ao futuro. O que faz crescer o País é o sector privado, mas nos últimos anos observamos um comportamento do sector privado que se reflecte num crescimento potencial muito baixo. Não vê dinamismo, entusiasmo, é isso? Tenho dificuldade em ver... Não estou a criticar ninguém, porque acho ridículo criticar os empresários. Agora, de facto, vejo pouca garra... desde há muitos anos que crescemos muito pouco. Mas qual a origem desta situação? Baixos níveis de confiança, formação dos empresários, efeitos da subsidiação estatal? Não é fácil explicar. Existem muitos factores que ajudam a compreender o fenómeno... de entre os quais, com certeza, uma política fiscal e orçamental errada. Uma das explicações podem ainda ser encontradas no enorme boom de consumo e de algum investimento no final dos anos 90, justificadas pelas baixas taxas de juro. Um ciclo que tinha de terminar. Aliás, é o colapso da procura interna a principal razão por que o País entrou em recessão económica. Mas admito que isto explique apenas uma parte da equação... Talvez a insuficiência das reformas estruturais... Não vejo as tais reformas estruturais... Fala-se na necessidade de inovação, formação, educação, mas tudo isto não é para amanhã e a urgência era ontem. Não há prescrições para a economia a curto prazo? Não conheço. Alguns economistas falam dos efeitos nefastos do famoso "discurso da tanga" de Durão Barroso... Não acredito que os agentes económicos vão em histórias, mas de facto vejo pouca "garra". As últimas previsões da Comissão Europeia indicam uma estimativa de crescimento de 1,6% para a zona euro. qual o significado para Portugal? Significa uma má notícia. Para Portugal a revisão em baixa da estimativa do crescimento foi ainda mais drástica. Os principais mercados do País na UE vão crescer pouco e teremos mais um factor negativo a acrescentar, que terão como resultado um fraco crescimento da economia portuguesa... Repercussões nas exportações, turismo... Temos, basicamente, dois problemas. Portugal tem perdido quotas de mercado e competitividade. Em 2004, a economia terá crescido 1,0% e a procura interna cerca de 2,0%. As exportações nem se portaram muito mal, o problema é que as importações aumentaram muito. Isto sugere que um pequeno impulso na procura interna provoca uma enorme repercussão nas importações. Ou seja, as empresas portuguesas são pouco competitivas. Isto, a par da queda do crescimento potencial da economia, é um problema grave. Os dados recentes demonstram que o crescimento potencial da economia está num ponto muito baixo... Neste momento, está à volta de 1,6% do PIB, quando Portugal deveria aspirar a um crescimento potencial bem acima de 3, 4%... Estamos a ter sucessivos crescimentos baixos, e o impulso da procura interna não se repercute no aumento do produto e não tem, naturalmente, repercussões no aumento do emprego. Isto para mim é, neste momento, o maior problema do País. Até quando teremos estas dificuldades? Não é fácil responder... Mas podemos ter este problema durante alguns anos. Posso arriscar mais uns quatro, cinco anos? Talvez nem tanto, mas... dois, três anos. Tenho alguma esperança na recuperação da competitividade e acredito que as reformas estruturais anunciadas pelos últimos governos, e em particular pelo actual, acabem por produzir algum efeito, num prazo razoável. As importações estão a provocar um novo disparo no endividamento externo, após uma redução em 2003. Não existe solução para estancar esta tendência? Enquanto a competitividade não melhorar, teremos esse problema. Preocupa-me que a um crescimento moderado da economia em 2004 reflectiu-se de imediato num aumento muito forte do endividamento externo. É um sintoma do tal crescimento potencial fraco. Mas graças à nossa presença na zona euro, o endividamento externo é um problema solúvel. Como não bastasse, o contínuo aumento dos preços internacionais do barril do petróleo poderá ter graves reflexos na economia portuguesa... Isso é um problema muito sério, mais sério do que prevíamos... Para a economia portuguesa é particularmente difícil, dado o alto grau de dependência do petróleo. Significa o empobrecimento do País... | |